quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

O relógio de Praga

O relógio de Praga

Praga é realmente uma das cidades mais bonitas da Europa. Para mim, o único defeito da cidade é ser excessivamente turística, pois todo lugar que tem o turismo como principal atividade me parece um pouco artificial, um pouco fabricado. Agora, isso não tira a beleza e a excentricidade de uma cidade em que boa parte dos prédios pertence ao século XII e boa parte das suas mulheres tem duas cores no cabelo. É serio, você vê várias mulheres em Praga de cabelos loiros com uma faixa preta ou rosa, ou luzes vermelhas, por exemplo. O lugar forma, junto com Amsterdã, os dois pontos turísticos da Europa mais visitados pelos próprios europeus: Amsterdã é para os jovens, Praga para os enamorados. É incrível a quantidade de casais em lua de mel por lá, e com razão, pois a cidade é linda.

Para mim, jovem e solteira, a diversão foi conhecer as histórias de cada espaço, pois num lugar onde tudo tem mil anos cada pedra pode ser narrada. Explorei a casa de Kafka, a ponte do castelo – o castelo de Praga é o maior castelo do mundo na atualidade – e a vista de cima da igreja. Fiz também uma caminhada. Se você fala inglês, precisa fazer uma, é um jeito diferente e muito bacana de conhecer a cidade: os guias contam várias histórias diferentes sobre cada lugar, e existem caminhadas de todos os tipos – escritores de Praga, histórias medievais, descobertas de Praga, Praga histórica. Fiz uma à noite, sobre as lendas de terror medievais, e descobri, por exemplo, que na Idade Média acreditavam que uma banshee morava na igreja das duas torres, gritando durante as noites pelo noivo que abandonou na terra e que trabalhava na igreja. Foi por causa de seu grito que uma das torres quebrou, e foi consertada de um modo diferente (repare uma janela a mais na torre da esquerda). Mas o mais incrível de todas as excentricidades da cidade é mesmo o relógio astrológico, construído no século X em plena igreja da praça central! (foto 0896) Esta é uma outra igreja bem próxima à anterior.
Aliás, a cidade tem umas quatro igrejas só no centro, e é emocionante ver ouvir todos os sinos badalando juntos em meio àquela paisagem – você se sente na idade média...
Voltando ao relógio: ele tem duas partes, uma representando os signos
e outra as casas do zodíaco, e ninguém, ninguém mesmo, sabe como ele foi parar lá, o que mede ou como funciona.











A teoria mais aceita era a de que ele era utilizado por alquimistas na Idade Média, que eram também os responsáveis por produzir os vitrais das igrejas. Posteriormente, em Dijon, meu padrinho, que leciona física na Universidade de Dijon, contou que atualmente os físicos sabem que as diferenças de cores são produzidas por nanopartículas, que os alquimistas sabiam manipular muito bem, embora não conhecessem sua estrutura. Para que será que servia o relógio astrológico?

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Porto Alegre e o Rio Guaíba

Quando fui a Porto Alegre num congresso, em 2003, tudo o que queria, além de apresentar meu trabalho, era aproveitar minha primeira viagem sozinha. Como em POA não tem albergue (uma pena) hospedei-me num hotel muito bacana e não muito caro, que ficava num clube (http://www.farrapos.org.br/hotel.htm Como todos os hotéis estavam lotados e não tinha mais lugar, fiz um acordo com a gerente de ficar num quarto numa casa no clube (muito bem estruturada) por 15 reais a diária. Quarto e banheiro só prá mim. Uma pechincha, ao lado da PUC-RS, onde seria o Congresso. Depois mudei-me para a casa da minha tia. Uns colegas de faculdade iriam também, mas acabei prefirindo ficar sozinha.
Peguei um ônibus para o centro e percorri toda a cidade, fiz compras, conheci o centro passei num posto turístico e peguei o ótimo guia, com pontos para conhecer. Estava tendo bienal, ao lado da Usina do Gasômetro (rua de mesmo nome) e eu fui visitar (você pode pegar os pontos turísticos em http://www.inf.ufrgs.br/turismo/poa/lista.html). O Gasômetro é uma usina desativada que virou museu, na frente do rio Guaíba. Todo mundo vai lá, ver o pôr do sol. Na bienal, fiz amizade com umas meninas de brasília que foram para o congresso, depois elas foram embora e eu fui ver o pôr do sol. Ao meu lado vários grupos tocando violão e fiquei embasbacada com a paisagem. Comecei desesperadamente a fotografar, gastei um filme de 36 poses, depois fiquei horas paralizada e por último comecei a escrever, tentando descrever a cena e o que eu estava sentindo. Assim ficou:


"Mário Quintana Só podia ternascido em proto alegre. O sol do gasômetro refletindo sobre as águas azuis do Rio Guaíba é pura poesia sobre o doce verde da outra margem. O sol se recolhe para seu descanso noturno, assistido por dezenas de pessoas sentadas na grama já batida, sensíveis o suficiente para não se incomodar em sujar a roupa, em parar um minuto no intenso agito da cidade, para apreciar o espetáculo. Esses poucos custos não são nada comparados ao explendor desta experiência. Aí está o mundo, apenas para nós felizardos que podem observar e sentir a calma de uma descida lenta, amarela, rosada e anil. De todas as cores. E de todos os climas, já que ora esquenta, ora esfria, ao balanço da disputa entre o sol e o vento. A mata na outra margem, que serve de leito ao sol como uma mãe que delicadamente recolhe seu filho nos braços, aos poucos mostra também suas formas de cerrado, acompanhada de dezenas de ássaros que riscam o céu, saudando o fim do dia." (10/2003)

Quando fui pegar o ônibus de volta, tinha um sorriso de felicidade estampado no rosto, estava me sentindo livre como nunca. E encontrei meus colegas:

- Nossa Tati, que cara de felicidade é essa?

E o outro:

- Tá na cara que ela encontrou alguém...

Eu nem sabia o que responder. Com aquela absoluta falta de sensibilidade, será que eles entenderiam o efeito que  um pôr do sol é capaz de provocar??? Por que é que a gente só pode ser feliz se estiver encontrado uma muleta para se encostar???? Me poupe. E também não estava a fim de raciocinar muito naquele momento, estragaria meu estado de espírito.

- Encontrei o gasômetro, vocês já foram lá?

-Já.

Eles me olharam sem entender, o que teria o gasômetro de mais? Eu peguei o ônibus, feliz da vida por não ter ido com eles. Ir a Porto Alegre a não se maravilhar com o pôr do sol do Gasômetro é como ir a Roma e não conhecer o Coliseu. O Papa, cá entre nós, é um chato e eu dispenso.